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A Importância da Família

20/10/1998

Wanda Marisa Gomes Siqueira* 

O Juiz Cândido Alfredo Silva Júnior, da 5ª Vara Federal, concedeu liminar para garantir a remoção de uma auditora fiscal do Tesouro Nacional do município de Bento Gonçalves(RS) para a cidade do Rio de Janeiro. 

A decisão do magistrado pode ser considerada inédita dada a sensibilidade em que a mesma está fundamentada, conforme se demonstra: 

"Realmente não se poderia exigir do marido da parte autora que transferisse o domicílio para Bento Gonçalves, já que é profissional devidamente estabelecido no Rio de Janeiro, conforme comprovado nos autos. A transferência apenas da criança para Bento Gonçalves também não se mostra apropriada, porque ainda assim o núcleo familiar estaria dividido e nada garantiria que a criança não tivesse os mesmos problemas, desta vez em razão do afastamento do pai. 

Além disso, para a União não há prejuízo com a remoção. Se a sentença for pela improcedência, a antecipação de tutela terá deixado de produzir seus efeitos, retornando tudo à disposição anterior. A própria parte autora reconhece e assume este risco. Já o não- deferimento da antecipação certamente permitirá que a situação seja perpetuada, causando mais danos à criança e desatendendo o que consta do art. 36, parágrafo único da lei 8.112/91. 

Não se pode esquecer que, para este juiz, a autora é simplesmente uma parte. Para a União, a autora é apenas uma auditora fiscal. Mas, para seu marido, a autora é sua esposa. Para a sua filha, a autora é sua mãe. Ora, esposa e mãe são mais que papéis sociais e jurídicos que possam ser moldados por categorias jurídicas em textos legais. Mais que isso, são pedaços de vida, incindíveis e insubstituíveis. Uma parte, um juiz, uma servidora podem ser substituídos. Podem ser removidos. Podem ser trocados. Tanto o Judiciário quanto o Administrativo são impessoais no agir. Não se preocupam com rostos. Estão vinculados ao princípio da continuidade do serviço público ou da inafastabilidade da jurisdição (caput do art. 37 da CF/88). Seja que pessoa for, sempre existirá um servidor ou um juiz para cumprir o encargo legal. As escadas de substituição são pré estabelecidas e impessoais. Não importa a pessoa, importa apenas a função. Mas na família, não existem substitutos. Não existe texto legal que possa substituir o carinho da mãe ou o sorriso da filha. São insubstituíveis. 

Decisão: Por estas razões, entendo presente o duplo requisito e, com fundamentos nos arts. 226 da CF e 273 do CPC, defiro a antecipação de tutela postulada e determino à autoridade administrativa competente que providencie, no prazo de dez dias, na remoção da parte autora para uma de sua unidades localizadas na cidade do Rio de Janeiro(RJ), com fundamento no art. 36, parágrafo único, inc. III, alínea "b" (motivo de saúde da filha Paula Lima Habib), da Lei 8.112/91, tudo nos termos da fundamentação. Intime-se e cite-se a União". 

O Poder Judiciário, assim, mostrou-se sensível à situação, decidindo a favor da união familiar e respeitando os interesses dos menores previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. 

Cabe aos cidadãos confiarem nos profissionais da carreira jurídica e lutarem por seus direitos sempre que entenderem necessário, eis que é dessa forma que podem contribuir para o aprimoramento das instituições sociais, especialmente numa época em que a família brasileira enfrenta crises sociais, econômicas, culturais, morais...". 

*Advogada

Publicado no Jornal do Comércio, Caderno Jornal da Lei, 20 de 0utubro/98

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