Médicos Gaúchos obtém Judicialmente Dispensa do Serviço Militar Obrigatório
Wanda Marisa Gomes Siqueira*
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região vem negando provimento a todos os recursos de Apelação interpostos pela União Federal contra as decisões de 1º grau que julgaram procedentes as ações ajuizadas por dezenas de médicos gaúchos com o objetivo de serem dispensados da prestação do serviço militar obrigatório.
Anualmente, no mês de janeiro, em todo o país, um grande número de médicos, dentistas, farmacêuticos e veterinários é convocado pelo Exército, Marinha e Aeronáutica para prestar serviço militar depois de terem sido dispensados ou colocados no excesso de contingentes por ocasião da convocação ocorrida quando ainda eram estudantes.
A legislação que autoriza a convocação desses profissionais (médicos, dentistas, veterinários, e farmacêuticos) está sendo mal interpretada e, na prática, sua aplicação está revestida de irregularidades. Agrava ainda mais a situação o fato de que não há qualquer critério na seleção de quem deve prestar serviço militar ou de quem será dispensado - normalmente prevalece o instituto do pistolão. Por essa razão, quando ocorre a convocação para a prestação do serviço militar obrigatório, em alguns casos dez anos depois da dispensa ou da colocação no excesso de contingente, não resta outra alternativa aos convocados senão buscar a proteção de seus direitos junto ao Poder Judiciário, como forma de evitar que sofram prejuízos na vida profissional e familiar.
Faz-se oportuno lembrar que as primeiras ações ajuizadas na década de 80 causaram um certo impacto, porque naquela ocasião havia muito receio de questionar qualquer ato praticado pelas autoridades das Forças Armadas.
Hoje, tanto os cidadãos que se consideram prejudicados com a lei que os obriga a prestar serviço militar obrigatório (mesmo não vocacionados para essa carreira) quanto as autoridades administrativas das Forças Armadas já se familiarizaram com esse tipo de ação.
Ainda que nunca tenha havido qualquer tipo de represália contra os autores das referidas ações, na prática ainda se percebe que existe no imaginário coletivo o receio de recorrer ao Poder Judiciário contra o Exército, a Marina e a Aeronáutica, como se essas instituições pudessem representar qualquer ameaça contra o cidadão, o que é um grave equívoco.
Aos poucos, observa-se que a cidadania está se dando conta de que a Constituição Federal assegura a qualquer cidadão o direito de bater às portas do Poder Judiciário sempre que um direito individual seu for lesado por quaisquer autoridades públicas.
Em nosso país, lamentavelmente, muitas leis ainda em vigor estão sendo mal interpretadas por ocasião da sua aplicação e outras ainda não foram adequadas à Constituição Federal de 1988. Cabe ao Poder Legislativo, através de seus representantes, revogar essas leis ou adequá-las ao novo texto constitucional.
Enquanto as autoridades do Poder Executivo e Legislativo permanecerem inertes cabe ao cidadão fazer prevalecer o seu direito através do Poder Judiciário.
A jurisprudência do tribunal Regional Federal da 4ª Região está se pacificando no sentido de julgar procedentes as demandas judiciais sobre a matéria, assegurando aos médicos (que são os profissionais que mais dificuldades têm de prestar serviço militar) o direito de não interromper sua vida profissional considerando que normalmente, quando convocados, estão realizando cursos de pós-graduação, mestrado ou doutorado.
A solução mais adequada seria a realização de concursos públicos para suprir as necessidades de recursos humanos das Forças Armadas na área de saúde, em respeito ao princípio constitucional que determina que o acesso a cargos públicos somente poderá ser feito através de concursos públicos.
*Advogada
Publicado no Diário da Manhã dia 29/12/97
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